Mário Patrão: “Se me perguntassem quando regressei se voltaria dizia que não”

Piloto português recordou o Dakar mais triste em que participou
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Mário Patrão
Mário Patrão

Mário Patrão fez nesta quinta-feira em conferência de imprensa o seu balanço da edição 2020 do Rali Dakar. Cerca de três semanas depois da prova, já em Portugal, em casa do seu patrocinador principal, o piloto português da KTM fez uma análise de tudo o que se passou, de tudo o que viveu nesta edição.

Que não foi pouco.

Sereno, calmo, objetivo, Mário Patrão recordou o Dakar que mais o marcou, onde perdeu um amigo, Paulo Gonçalves. Onde foi testemunha principal de mais uma fatalidade, com Edwin Straver. Numa prova em que o susto foi constante, que não correu à altura do que é exigido, que provocou dúvidas em quem a vive. E que acaba por colocar em causa esse sentido que a vida toma em cima daquelas duas rodas.

Depois de um ano difícil de preparação em 2019 com uma lesão ainda para recuperar, a perspetiva mais tranquila para atacar a primeira semana do Dakar foi contrariada logo ao terceiro dia devido a problemas com a KTM. A alteração de planos conseguiu ser recuperada e a segunda semana era encarada de forma positiva.

“Mas no início da segunda semana tivemos logo o que aconteceu com o Paulo e isso fez-nos pensar. Depois aconteceu [o que aconteceu] com o colega holandês”, recordou Mário Patrão elevando a participação no Dakar para o plano existencial, para o mais essencial: “A nossa vida vale muito pouco. Ninguém quer perder a vida assim.”

Mário Patrão não tem dúvidas no que sentiu nem teve reservas em partilhá-lo agora: “Se me perguntassem quando regressei se voltaria dizia que não.” O piloto português não faz depender acontecimentos. Mas estes fazem parte de um mesmo todo e Mário Patrão não obsta também a juntar no mesmo discurso as deficientes “marcações dos níveis de perigo”, que teve oportunidade de manifestar ao organizador, e a fatalidade.

“Foi o que aconteceu com o Paulo. ‘Isto é um Perigo 2’, mas às vezes é um Perigo 3. E uma vez em mil as coisas correm mal.” “Quando é areia não há problema, mas quando há pedra há um efeito muito drástico, a traseira da moto bate e o piloto é cuspido”, elucidou.

Mário Patrão aponta que os problemas no Dakar “este ano tiveram a ver com falhas de organização”. “Têm condições naquele país para fazer grande corridas, mas é preciso trabalhar mais. Não houve um dia em que chegasse ao fim e não me tivesse assustado”, recordou o piloto português explicando que “só a pessoa que faz o ‘road book’ é que sabe o que esta lá”.

“Foi o Dakar que mais me marcou, o mais triste, porque perdi um amigo. Quando é com um amigo ficas com vontade de ir embora. Todos nós sabemos o risco que corremos, mas queremos ir à luta. Se o Paulo estivesse lá nunca iria permitir que um de nós não fosse pelo que aconteceu”, disse Mário Patrão no regresso às frases da saudade por quem partiu fazendo o que ele também faz: “Agora penso que isso pode acontecer, mas, a partir do momento em que arranco na moto isso não me passa pela cabeça.”

As perguntas que sucederam ao primeiro discurso voltam a colocar a tónica nas deficiências organizativas: “Esse assunto foi sentido por todos, a pouca navegação. Todos mostrámos descontentamento ao diretor de corrida. Ele reconheceu que a corrida foi fácil para ele, mas muito perigosa para nós.”

Mário Patrão apontou que “havia muito poucas notas”, deu como exemplo que no ‘road book’ “estava marcado Perigo 2 durante 10 km em vez de se assinalar onde estava o perigo”. Depois de falar com o diretor de prova, o piloto português acreditou que “ele sentiu que as coisas não estavam bem”. “Em quatro ou cinco meses ele não conseguiu planear a corrida como se fez na América do Sul. E torna-se muito perigoso”, frisou.

De volta a Paulo Gonçalves, Mário Patrão não faz depender situações no mesmo todo. “Se a organização esteve bem!? Não. Se teve culpa!? Não creio.” “Acredito que a hora do Paulo estava ali. Não vamos culpar a organização”, disse o piloto português da KTM. “O Paulo passou por vários Perigo 2 antes. Penso que aquele também seria igual. Acredito que aquele era o dia para ele”, acrescentou.

Crente também de que vai haver mudanças para a edição seguinte, Mário Patrão confirma que “o limite de velocidade está em cima da mesa”, mas garante também que “esse não é o caminho”. “Se eu cair a 150 ou a 180 km/h é igual, não é por aí. O caminho será melhorar a navegação, marcar melhor [os perigos]”, explicou o 32.º classificado deste ano.

“É preciso que as pessoas que fazem o ‘road book’ o façam com mais consciência e marquem tudo o que há para marcar. Eles tiveram pouco tempo para preparar e então fizeram as coisas fáceis, marcaram tudo a direito”, referiu Mário patrão lembrando o exemplo da primeira duna com 15 metros que enfrentou e não estava assinalada: “Era um Perigo 2, tinha de estar marcada.”

E as razões para tornar a prova mais difícil em termos de navegação, porque esta faz parte do jogo, não é justificação: “Uma coisa é facilitar a navegação, outra é dar segurança.”. Mário Patrão dá a marcação de pontos perigosos como ‘waypoints’ – evitando perigos obrigando os pilotos a passarem por lá de forma controlada – como um exemplo do que acredita vir a ser melhorado: “O organizador ouviu e penso que pensou. Por isso, ele reconheceu que quis fazer fácil.”

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